Caros diocesanos. Estamos vivendo a Semana Santa, com
suas solenes celebrações que tornam presente os mistérios da morte e da
ressurreição de Jesus Cristo, na vida da Igreja e do mundo. Diante do infinito
amor de Deus, revelado sobretudo no sofrimento e na violenta morte de cruz,
nossa tendência humana é silenciar, pois as palavras se tornam muito pobres
para explicar o que aconteceu. Ao refletir sobre estes mistérios veio-me à
memória o encontro do Papa Francisco, no início de fevereiro ado, com
pessoas cruelmente atingidas pela guerra no Leste da República do Congo –
África. Crianças, jovens e adultos narravam ao Papa as atrocidades que sofreram
pessoalmente ou as presenciaram em relação a familiares ou pessoas próximas,
como rapto dos bens e das próprias pessoas, quando estas não eram mortas
violentamente diante delas. Meninos e meninas
diziam que somente queriam a paz, e se comprometiam a perdoar seus algozes e a
viver em espírito de fraternidade e reconciliação para construir um futuro
melhor em seu país. Colocaram diante de Cristo crucificado os objetos das
agressões e mortes, com palavras de perdão: “Perdoamos nossos algozes. Eis porque
coloco diante da Cruz de Cristo vencedor o facão igual ao que matou meu pai”. Outra criança dizia: “Peço a Cristo vitorioso na cruz que toque o coração dos algozes para
que libertem as outras crianças que ainda estão no mato”. Uma terceira ainda
acrescentou: “Santidade, em tudo isto a
Igreja continua a ser o único refúgio que cura as nossas feridas e consola os
nossos corações por meio dos seus numerosos serviços de apoio e conforto”. Dentro
deste contexto desastroso dos fatos já consumados, lembrei da frase de
Saint-Exupery: “Ternura inútil, mas
ternura. Conselhos inúteis, mas amigos” (Terra dos Homens). E mais do que
isso, como cristãos, lembramos o Evangelho da Paixão, quando Jesus dizia,
pendente na cruz: “Pai,
perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem”!
(Lc 23, 34). A atitude das pessoas que narraram as crueldades, com espírito
de perdão e de proposta de recomeço, fala por si e faz silenciar os corações.
O Papa Francisco ouviu os relatos angustiantes das vítimas dos conflitos, incluindo estupro, amputação, canibalismo forçado e escravidão sexual, além de outros. Tendo estas pessoas ajoelhadas diante de si, num primeiro momento, o Papa, sensivelmente abalado com as narrativas, apenas impôs carinhosamente as mãos e disse: “Diante da violência desumana que viram com seus olhos e experimentaram na própria pele, ficamos impressionados. E não há palavras; só chorar, ficando em silêncio”.
Em seguida o Papa emitiu um discurso de fortes oestações, criticando as atrocidades como crimes de guerra: “Chega! Chega de enriquecer às custas dos mais fracos, chega de enriquecer com recursos e dinheiro manchados de sangue”! Com o mesmo teor, num encontro com diplomatas e outras autoridades, afirmou profeticamente: “É trágico que o continente africano padeça de várias formas de exploração. (...) Depois da exploração política, desencadeou-se um 'colonialismo econômico', igualmente escravizador. (...) Este país e este continente merecem ser respeitados e ouvidos, merecem espaço e atenção. Tirem as mãos da República Democrática do Congo, tirem as mãos da África! Chega de sufocar a África: ela não é uma mina para explorar, nem uma terra para saquear. Que a África seja protagonista do seu próprio destino”! E acrescentou Francisco: “O veneno da ganância tornou os seus diamantes ensanguentados. É um drama diante do qual, muitas vezes, o mundo economicamente mais desenvolvido fecha os olhos, os ouvidos e a boca”. Finalmente, o Papa Francisco fez veemente apelo à paz, pois somente ela pode desencadear a esperança de novo futuro. A Páscoa seja ocasião de Paz para nós e toda humanidade.
Dom Aloísio Alberto Dilli – Bispo de Santa Cruz do Sul